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A Associação dos Conselheiros Representantes dos Contribuintes no CARF (ACONCARF) vem prestar necessários esclarecimentos à sociedade brasileira acerca das propostas de medidas de recuperação fiscal, anunciadas em 12/01/2023, que estão relacionadas à paridade de julgamentos de processos administrativos tributários no órgão, e citadas de forma injusta aos Conselheiros, além das repercussões relacionadas ao voto de qualidade, que seriam justificadas em razão de dados apresentados pelo TCU (TC 038.047/2019-5).
Inicialmente, cumpre destacar que o CARF é um órgão quase centenário, especialista em matérias tributária e aduaneira, e que não possui “viés” arrecadatório. Tem por função o julgamento de recursos administrativos para o fim de garantir o duplo grau de jurisdição e o controle constitucional da legalidade do ato administrativo fiscal, permitindo a consolidação de um crédito tributário com a necessária Segurança Jurídica.
Historicamente, teve início com o Decreto nº 16.580, de 04 de setembro de 1924, e, desde então, já contempla a participação de representantes dos contribuintes na composição e deliberação das decisões colegiadas.
Nesta oportunidade, são importantes os seguintes esclarecimentos:
i) Da paridade
No Decreto nº 5.157, de 12 de janeiro de 1927, os recursos interportos pelos interessados seriam julgados e resolvidos por um Conselho constituído, em partes iguais, por funcionários da Administração Pública e por contribuintes nomeados pelo Governo, estes por proposta das principais associações de classe representativas do comércio e da indústria, sob a presidência do Ministro da Fazenda ou da autoridade fiscal por ele designada.
A participação de representantes dos contribuintes é imprescindível para efetivação dos princípios e valores democráticos, contribuindo para a formação de precedentes através de julgamentos realizados de forma paritária e pautados em votos legalmente fundamentados, proferidos por Conselheiros especialistas e altamente técnicos e capacitados, os quais, em sua grande maioria, são docentes, doutrinadores, ministram cursos e palestras, com relevante gabarito acadêmico.
É importante igualmente esclarecer que os Conselheiros dos contribuintes são alçados à função em rigorosíssimo procedimento de seleção, que leva em condições notório conhecimento jurídico na área tributária, gabarito acadêmico e comprovada idoneidade, cuja aprovação precede à análise através de Comitê formado pela Presidência do CARF e por representantes da Receita Federal do Brasil, Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, Confederações Representativas das Categorias Econômicas de Nível Nacional, Sociedade Civil e da Ordem dos Advogados do Brasil. Tanto o trabalho desenvolvido por cada Conselheiro no exercício do Mandato, quanto a idoneidade e vida pregressa, são avaliados a cada dois anos para autorização de recondução ao cargo.
Os Conselheiros se deparam com casos extremamente complexos e a qualidade do conteúdo decisório é reconhecida pelo Poder Judiciário, com constantes citações como fonte de referência em decisões proferidas perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunais Regionais Federais (TRF).
É nesse contexto que se insere o relevante trabalho dos(as) Conselheiros(as) egressos das Representações de Contribuintes, os quais atuam de forma a aplicar a legislação tributária e com obediência às regras tributárias e processuais, bem como ao Código de Ética do CARF, desempenhando suas funções com seriedade e comprometimento não apenas com o órgão e com a sociedade, mas também com suas biografias e currículos citados.
ii) Morosidade
O órgão passou por diversas transformações, e sempre foi um dos instrumentos de realização de solução de conflitos entre Fazenda e Contribuinte, e que atualmente obteve, inclusive, o ISO 9001:2015, por três anos consecutivos (2017, 2018 e 2019), que avaliou a gestão de qualidade; analisou detalhadamente os processos finalísticos, a política de gestão de riscos e a comunicação, não identificando “nenhuma inconformidade”.
É um equívoco atribuir aos Conselheiros indicados pelos contribuintes a culpa pelo estoque do CARF ter dobrado no último ano.
Registre-se que, durante a maior parte do ano de 2022, houve uma greve dos Auditores Fiscais Federais, não ocorrendo sessões de julgamento por 8 meses sucessivos, iniciada em dezembro de 2021, e que obviamente causou um grande impacto no estoque de julgamento. Ainda assim, os(as) Conselheiros(as) egressos dos contribuintes continuaram seu trabalho normalmente, independente do citado movimento grevista, indicando processos para pautas de julgamento e confeccionando votos durante esse tempo, sem qualquer paralização.
Somado a isso que, nos anos de 2020 e 2021, a pandemia decorrente da COVID-19 teve impacto no estoque do Tribunal, já que as sessões de julgamentos ficaram paralisadas por 4 meses e, quando do seu retorno, em que foram estipuladas somente sessões virtuais, os processos pautados eram de até um milhão, sendo que muitos processos foram retirados de pauta em razão de pedidos da Fazenda Nacional e dos próprios contribuintes, que requestavam julgamentos presenciais, quando do regular retorno das atividades.
Ressalte-se que as reformulações do CARF, realizada desde 2015, mediante sucessivas e exitosas gestões, consolidou resultados relevantes nos julgamentos e representou um aumento significativo de baixas do estoque. No relatório já citado, de janeiro/2019 a outubro/2022 (último mês do levantamento), o estoque de processos aguardando distribuição reduziu de 93 mil para 51 mil processos, ou seja, uma redução de 45,17% em apenas 4 anos. E lá estavam os(as) Conselheiros(as) citados(as)!
Ainda, dados do Tribunal de Contas da União davam conta que o órgão caso parasse de receber recursos dos contribuintes para julgar, teriam um estoque de 70 anos para julgar. Após a implementação no gerenciamento dos resultados, esse estoque diminuiu para incríveis 6 anos, em 2017/18.
É importante ressaltar que o Brasil tem um complexo sistema tributário que gera uma imensa macrolitigância fiscal, tanto no âmbito administrativo quanto no judicial, sobre o qual a sociedade brasileira impõe – através das leis que seus representantes aprovaram – que autuações fiscais sejam revistas e filtradas em âmbito administrativo.
Portanto, atribuir responsabilidade aos Conselheiros egressos das representações dos contribuintes pelo aumento no estoque do CARF é injusto e merece esclarecimento à sociedade brasileira.
iii) Voto de qualidade
A MP 1.1160/2023 determinou o retorno do voto de qualidade. A decisão institucional por adotar o voto de qualidade em favor da Fazenda ou do contribuinte cabe aos Poderes Legislativo e Executivo. Aos Conselheiros cabe a aplicação dessa decisão, sem questioná-la, em obediência não só às normas éticas aplicadas aos Conselheiros, mas também pelo princípio da imparcialidade que advém do exercício de atividade judicante.
Sejam quais forem as razões para sua escolha, não se pode atribuir aos Conselheiros egressos dos contribuintes a responsabilidade pelo estoque do CARF ou, ainda, pela morosidade, e até mesmo de forma injusta colocar em xeque a imparcialidade dos seus membros.
Ademais, importa registrar que a paridade de Conselheiros e o voto de qualidade são os fatores que menos impactam no estoque de créditos de CARF, pois a esmagadora maioria de processos não é julgada com empate favorável ao contribuinte.
Os dados abertos referentes aos últimos 5 anos, publicados no site da instituição[1], revelam de forma clara que, após o fim do voto de qualidade, a maioria de processos não é julgada com empate favorável ao contribuinte, atingindo a marca de 98,1%:
Os números demonstram, ainda, que as decisões são majoritariamente por unanimidade ou por maioria, revelando que os empates nos julgamentos são extremamente baixos. Basta analisar os dados publicados no mesmo relatório do CARF, os quais demostram que o empate é exceção, e está longe de ser uma regra:
No item 46 do relatório do TCU, é citado que, com relação aos resultados do PAF, no período de 2012 a 2019, em termos quantitativos, 47% das autuações tributárias objeto de litígio foram canceladas total ou parcialmente nas DRJ e 45%, no CARF. O fato de quase metade do crédito tributário lançado por autuação ser cancelado demonstra haver distância significativa entre Fisco e Contribuinte. Segundo a RFB (peça 46), a reforma dos lançamentos pelo CARF deve-se a diversos fatores, como a apresentação de documentação omitida durante a fiscalização ou a complexidade da legislação tributária, agravada pela diferença de marcos normativos entre a RFB e o Carf.
Nesse sentido, o relatório cita ainda:
52. Ao final do PAF, apenas 5% do valor das autuações mantidas são arrecadados aos cofres do Tesouro Nacional, já considerando o Refis - Programa de Recuperação Fiscal. O total arrecadado no período de 2012 a 2019 foi de R$ 32 bilhões, sendo que os custos do Carf corresponderam a 1% desse total (R$ 349.307.586,86 – cf. tabela 46 do apêndice G).
...
56. Diante desses custos, nem todos recorrem à Justiça por não valer a pena, mas com certeza os grandes devedores recorrem. Analisando a quantidade e o perfil dos devedores inscritos em dívida ativa informados na publicação ‘PGFN em Números’, os grandes devedores correspondem a menos de 1% em termos quantitativo e 67% em termos de valor. Para eles, com certeza, vale a pena continuar litigando e protelar o pagamento da dívida, pois gastam menos com o processo (ainda que percam), do que recebem com os rendimentos em aplicações financeiras: o crédito tributário é atualizado pela taxa Selic e os Refis sucessivos acabam por tornar a postergação do pagamento do tributo vantajosa. Nesse sentido, argumentam os procuradores da PGFN (peça 89, p. 2).
Assim, o fim do voto de qualidade não é o fator que causa impacto no estoque de processos, havendo inúmeros fatores que devem ser considerados.
iv) Aplicação das decisões judiciais
Os julgadores do CARF atuam com inteiro respeito institucional às decisões judiciais consolidadas nos Tribunais Superiores, conforme regra expressa de seu regimento, com absoluto caráter vinculante, bem como as súmulas aprovadas e reconhecidas pelo próprio Ministério em que se insere[2].
Importa registrar que o CARF realiza o controle do ato administrativo de lançamento, que representa pela Constituição um dos grandes instrumentos de proteção do Estado Democrático de Direito, mediante processos que, de um lado, permitem ao contribuinte realizar sua ampla defesa e contraditório, com sustentação oral e plena realização de atos instrumentais e, de outro, à Administração Pública filtrar a legalidade de seus atos.
Por outro lado, o Conselho tem por obrigação reproduzir as decisões pacificadas do poder judiciário. Conforme o art. 62, do RICARF, o Conselheiro que deixar de aplicar decisão judicial definitiva em matéria de Recurso Repetitivo do STJ e Extraordinário, em sede repercussão geral do STF, está sujeito a representação para perda de mandato.
Logo, não há razão para criticar a atuação dos seus membros quanto ao pretenso não cumprimento de jurisprudência consolidada no Poder Judiciário, pois é exatamente o contrário que ocorre na prática, e que essa realidade não foi modificada com o fim do voto de qualidade, já que não é permitido não aplicar decisões judiciais já pacificadas e nos termos acima citados.
v) Das conclusões
As insinuações de que os Conselheiros dos contribuintes aplicam somente decisões favoráveis aos contribuintes de forma desarrazoada, indevida ou não fundamentada não possuem veracidade alguma, já que o Conselheiro que assim agir incorre em penalidades no código de ética do CARF, bem como nas esferas administrativa, penal e cível. O CARF tem rigorosa atuação para identificar e impedir qualquer tipo de combinação de resultados. Tal prática é repugnada pelos próprios Conselheiros.
A ACONCARF vem esclarecer e expor a todos, em especial aos Órgãos de Controle que analisam a atuação dos Conselheiros egressos de representações dos contribuintes, a realidade sobre os fatos que há algum tempo já vêm sendo objeto de infundadas desconfianças, e solicita que sejam avaliadas as razões técnicas imprescindíveis aos julgamentos para solução de litígios administrativos tributários e os devidos resultados positivos entregues ao Órgão e, acima de tudo, requer o devido respeito com os profissionais que atuam e dedicam tempo de sua vida aos serviços prestados à sociedade.
Brasília-DF, 17 de janeiro de 2023.
Diretoria da ACONCARF
Wesley Rocha
Presidente
Cynthia Elena de Campos
Vice-Presidente Financeira
Laércio Cruz Uliana Junior
Vice-Presidente Executivo
Sabrina Coutinho Barbosa
Secretária-Geral
Fredy José Gomes de Albuquerque
Vice-Presidente Institucional
[1] Os dados mais atualizados, nessa data, vão até outubro/2022: http://carf.economia.gov.br/dados-abertos/dados-abertos-202212-final.pdf [2] Art. 62 do Regimento Interno do CARF, com seus incisos e parágrafos.
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